Um “silêncio enorme” cai no Maracanã. 200.000 pessoas olham para o campo de futebol, a bola parada dentro da baliza, onze camisetas azuis correndo na grama, onze camisetas brancas sem nem a força de levantar as cabeças. O dia é o 16 de julho 1950, faltam onze minutos ao fim da final do Mundial de futebol e o atacante da equipe do Uruguai Alcides Ghigghia acaba de marcar o gol que determina a derrota da seleção brasileira por dois a um.

O goleiro Barbosa após o segundo gol do Uruguai¹

Foi numa entrevista com a BBC que o ex-jogador uruguaio definiu a atmosfera que se criou no estádio histórico de Rio de Janeiro após o gol mais importante da sua vida “um silêncio enorme.”  Por causa disso, no Uruguai ele é lembrado como o homem que fez o Brasil chorar e ele mesmo costumava dizer que “apenas três pessoas silenciaram o Maracanã: o Papa, Frank Sinatra e eu.”

Foto aérea do Maracanã no dia da final²

Mas não foi apenas uma partida de futebol que foi perdida. A Seleção representava a identidade nacional brasileira. Ganhar a Copa do Mundo no Brasil não significava apenas alcançar um objetivo esportivo de prestigio mas afirmar a relevância da identidade e da realidade brasileira no mundo. É por isso que o técnico da Seleção Flávio Costa falou numa entrevista com o jornal O Globo que “quem perdeu a batalha […] não foi eu só, foi o Brasil todo, foi o Brasil inteiro. Se houve uma desgraça é esta.”

Foto tirada dentro do estádio que mostra uma parte dos 200.000³

Esta derrota causou um trauma cultural que segundo muitos estudiosos ainda não está superado apesar de outro sucessos esportivos que seguiram. Após a derrota do Maracanazo, o escritor brasileiro Nelson Rodrigues criou a expressão “complexo de vira-lata” em relação aos efeitos deste jogo na cultura do país. O termo refere-se a um fenômeno social de inferioridade em que o brasileiro se coloca e que é devida à sua carência de autoestima. Sendo essa, na teoria do Rodrigues, uma condição endêmica no país, tem sentido que em 1950 os brasileiros colocaram todas as suas esperanças na Seleção, uma equipe forte que era o orgulho nacional e símbolo de identidade social no Brasil.

O jornalista uruguaio Eduardo Galeano contou que no dia depois da partida um jornal de Rio de Janeiro comentou exageradamente esta derrota na primeira página com o título seguinte: “A Nossa Hiroshima.” Outros jornais definiram o jogo uma tragédia nacional ou uma vergonha.

Exemplos de páginas de jornais depois do jogo⁴

Talvez esses títulos ou comentários podem parecer ingênuos e excessivos mas precisamos lembrar que o Maracanazo tive um impacto profundo na sociedade brasileira: em dia 16 julho 1950 foi gerada uma ferida que ainda não está completamente curada. O trauma é tão atual que entrou na superstição popular do país e, por causa disso, numa entrevista que houve em 2020 o ex-jogador brasileiro Edílson declarou, entre várias polemicas, que “goleiro negro na seleção brasileira [como o Barbosa em 1950] dá azar.”

Podcast sugerido:
https://www.nexojornal.com.br/podcast/2020/07/16/70-anos-do-Maracanazo-quando-um-jogo-vira-trauma-coletivo

Artigo sugerido:
https://www.publico.pt/2014/06/11/desporto/noticia/maracanaco-a-historia-de-uma-derrota-eterna-1639335

Vídeo sugerido:

Filme sugerido:
Maracaná (2014), Sebastian Bednarik, Andres Varela (Espanhol).

Livro sugerido:
Nelson Rodrigues, A Sombra das Chuteiras Imortais: Crônicas de Futebol (Companhia das Letras).

[1] https://i.dailymail.co.uk/i/pix/2014/07/07/article-2683710-1F759AAA00000578-584_964x611.jpg
[2] https://www.welt.de/geschichte/article128970396/Das-Trauma-von-1950-quaelt-Brasilien-noch-heute.html
[3] https://medium.com/soccer-stories/world-cup-1950-the-maracanazo-5f737df90425
[4] https://www.futbolsapiens.com/columnas-fs/el-dia-que-brasil-enmudecio-maracanazo/

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